sábado, maio 17, 2008

Porque é que isto não me causa espanto!?

Os números são elucidativos: na região de Lisboa e Vale do Tejo cada oftalmologista fez em 2006 cerca de 1090 consultas por ano, contra as 1380 asseguradas pelos seus colegas da região Norte e as 1528 garantidas pelos profissionais do Centro. Também na média de cirurgias/médico, Lisboa e Vale do Tejo ficava a léguas das outras regiões: abaixo das 100 cirurgias por médico/ano, quando no Norte cada médico fazia 233, em média, e, no Centro, 238. Estes dados já eram conhecidos desde o Verão passado, altura em que a Inspecção-Geral das Actividades em Saúde (IGAS) concluiu um detalhado relatório sobre a situação. Mas só depois de as primeiras excursões de idosos de Vila Real de Santo António a Cuba (ver reportagem abaixo) aparecerem na comunicação social é que a lista de espera se transformou em escândalo nacional. O ex-ministro Correia de Campos chegou a dizer que bastava que os médicos fizessem mais meia consulta e 0,6 cirurgias por dia para que o problema se resolvesse.
São vários os especialistas que asseguram que, se Lisboa e Vale do Tejo trabalhasse ao mesmo ritmo que as outras regiões, o problema estaria muito atenuado. Os dados mais recentes da Administração Central dos Sistemas de Saúde (2007) corroboram os da IGAS: são enormes as assimetrias regionais. Florindo Esperancinha, coordenador do grupo de trabalho que fez um levantamento da situação, defende que estas assimetrias não são reais e que se devem a diferenças de registos, porque há hospitais que consideram todo o tipo de cirurgias e procedimentos e outros não. Mas Jorge Breda, presidente da Sociedade Portuguesa de Oftalmologia, não entende esta explicação, até porque as inscrições para cirurgia "estão em computador". Viajemos então até ao terreno. O segredo do sucesso dos Hospitais da Universidade de Coimbra (HUC), a unidade pública que mais cirurgias e exames da especialidade realiza, é muito simples: os oftamologistas têm à sua disposição um bloco operatório com três salas a funcionar de manhã e de tarde; além disso, desde há dois anos que funcionam como centro de responsabilidade, o que significa que os médicos recebem incentivos por produzir mais. "Há todo um passado de organização e motivação do pessoal", diz o director do serviço, Cunha Vaz. Como é que conseguem fazer cinco vezes mais cirurgias do que o Hospital de Santa Maria, em Lisboa? "Havia um treinador do Benfica que dizia "no comments"", ironiza, para depois destacar um dos factores que pode justificar tal diferença: "O acesso ao bloco operatório é crucial."No Hospital de S. João, no Porto, o segundo mais produtivo, não há incentivos nos moldes dos praticados nos HUC. Mas há pagamento à parte. "Operamos em cirurgia adicional [integrada no Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia]", explica António Oliveira e Silva, director clínico. Cada cirurgia à catarata rende 809 euros, revertendo 52 por cento para o hospital e 48 por cento para a equipa. Os profissionais recebem mais, portanto, mas nem com pagamento adicional este programa conseguiu seduzir os oftalmologistas de vários hospitais de Lisboa. Alexandra Campos

in Público

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