sábado, novembro 24, 2007

Dário da Missão a Tombali 1º Grupo


Pois é, o primeiro grupo já está em terras guineenses. Assim, e à medida que a informação for sendo disponibilizada pelos protagonistas (o que acontecerá somente nos fins-de-semana que forem a Bissau), colocarei aqui no Blog.


Os protagonistas são, Dimitri - A Gazela Africana; Vilas-Boas - o meia leca e João Esteves - O Diabo Vermelho.
Sóse cumá? Cumá di corpo?

Façam um favor a vocês próprios, não venham. Isto é mau demais para ser verdade!!! Imaginem que estão no fim do mundo. Já está? Agora elevem à décima potência e multipliquem por 450. Agora estão preparados para começar a pensar o que isto é na verdade. Começar disse eu, porque para saber mesmo o que isto é, têm de cá vir, e ver. Ver, ver, ver.. com olhos de ver. Bissau é mau de mais para ser verdade. Não podem andar nas ruas sozinhos. Branco é visto como diferente, como extorquidor, como assassino. Português é visto como traidor, homem mau, homem não desejado na terra deles. Não vão poder nunca andar sozinhos. Eles têm armas em punho, que exibem cruelmente nas ruas de Bissau. O Dimy têm-nos valido, e muito! Em 2 dias fomos abordados umas dezenas de vezes. As catanas brilham com o Sol reluzente. Depois não há passadeiras, o pessoal atravessa-se na estrada e não quer saber dos carros, se apitas estás sujeito a ser degolado em três tempos, porque virão atrás de ti no Toca Toca, numa perseguição infernal mesmo à Imagens Reais (tivemos a oportunidade de ver o início de uma perseguição, o início friso). Polícia nem vê-la. À noite não podem sair de casa, porque além de não haver luz, estão sujeitos a esbarrar no corpo de um dos “2 milhões” de guineenses que colmatam todas as ruelas de Bissau. Enfim.. para ver com os vossos olhinhos!!!

Antes de mais, e sem que antes passemos a dar indicações precisas acerca do que é preciso trazer para cá, cabe-nos informar, que estamos em África, mais concretamente na Guiné-Bissau, e neste preciso momento estamos a escrever do Sul (Iemberem). Como imaginam isto não é propriamente a Europa, aliás de Europa tem muito pouco ainda, apenas alguns brancos (contamos aí uns 5 no máximo em 4 dias que cá estamos), produtos importados que para cá vêm para os mercados locais serem vendidos a preço de ouro (nada que não se pague aí em Portugal, mas para o caso, é demasiado caro, e ainda estamos para saber quem é que compra alguma coisa aquele preço, a não ser branco ou pessoa com dinheiro e que precise mesmo), e na tabanca onde estamos luz, água “canalizada” e casas de tijolo, pintadas com tijoleira no chão coisas fundamentais, que nem na capital existem ainda (parece mentira mas é verdade).

Queremos também dizer, que a nossa missão está a ser bem conseguida, mas que vocês vão ter um papel mais importante ainda, no sentido de ver realizados os nossos objectivos por inteiro. Além do já pré-estabelecido entre nós, vão poder contar com mais algumas coisas / instrumentos / fármacos, caso consigam trazer, que têm espalhado esperança e agradecimento de todos os habitantes locais pelas tabancas onde temos passado.

1ª nota: este povo é fenomenal! Pobre mas sempre com um sorriso de orelha a orelha! É incrível… Só quando estiverem cá irão perceber o que queremos dizer. Mas fiquem com esta nota. Mesmo sem o Dimi, não terão qualquer problema, quer em Bissau e muito menos aqui no Sul. Podem passear à vontade no “Texas”que é Bissau. E no Sul terão sempre crianças a quererem dar-vos a mão, dar-vos um olá! É a melhor imagem que levamos daqui… Ficamos todos derretidos.
A ideia de que estávamos em vantagem por virmos com o Dimi era correcta. As crianças percebem mais ou menos o português, mas têm sempre que levar convosco às escolas alguém da AD que fale crioulo. Terão que se sentar com essa pessoa e explicar-lhe todas as mensagens que querem passar às crianças.
Aqui no Sul, o responsável por tudo relacionado com a AD e com o nosso trabalho, chama-se Abubacar Serra. É com ele que tudo é planeado… Desde a logística, passando pela alimentação e pelo plano de actividades.

2ª nota: de tudo o que estiverem a pensar trazer, tragam SEMPRE em quantidades 10 vezes superiores aquelas previamente delineadas.

3ª nota: se puderem poupar espaço nas mochilas, trazendo menos roupa e acessórios que não são de importância fulcral cá, para meterem mais coisas, fármacos, prendas, livros, bonecos, … para dar às crianças, POUPEM (digo eu)!!! Porque a verdade é esta, vão ficar hiper, super, mega ri-fixe, contentes e com a alma repleta, quando derem um simples rebuçadito a qualquer criança de cá…

4ª nota: a impressão de todos os documentos deverá ser feita lá na Papelaria Fernandes ao pé do IMVF, como já foi dito previamente pelo Rato. Tratem dos bilhetes com a Top Atlântico. Vistos com a mamalhuda da Ana Semedo. Tratem da farmácia pessoal (muito importante). Nós deixamos o que sobrar, mas têm impreterivelmente que arranjar / trazer mefloquina para vocês os 3 e vibramicina para os 3.

5ª nota: TRAGAM O HARRISON, apesar de ser trabalho árduo, o tempo aqui demora mesmo MUITO a passar.. como tal aproveitem para adiantar qualquer coisinha. O Dimy num dia “leu” 30 páginas (LOL).

6ª nota: Abriny tem aqui uns macacos de cauda branca que chamam pelo teu nome durante toda a noite!!! Anseiam pelo teu rabinho quentinho e musculado. Aqui é que vais ver, quem realmente levanta ferro. Pede ao Dimy para te apresentar o Nicandro. Até choras.

A: à chegada a Bissau, deverão fazer uma série de compras para poderem ter no Sul (caso não tenham trazido da Europa), como:
- água com fartura (estamos a fazer uma média de 3L por dia para os três)
- café
- açúcar
- cerveja (para não perder o contacto com o mundo, no meio desta tranquilidade toda, faz-nos relembrar bastantes coisas, e saborear algo conhecido)
- álcool etílico
- lixívia
- sacos do lixo (muitos)
- papel higiénico
- león brandi (repelente de interior que se acende com isqueiro; têm duração de 12horas se bem que a eficácia contra o anofélio é questionável, já que costumamos ter um aceso durante a noite, e eles andem sempre a melgar o Dimy)
- lanterna
- sabonete
- clips
- fio / corda para prender as redes mosquiteiras, fazer de estendal da roupa, …
- outras coisas que achem que precisam

B: lista de coisas a trazer para deixarem cá (era bom vocês conseguirem mesmo trazer isto tudo, porque a falta é imensa, e só quem cá vem, é que pode dar valor ao que temos aí com tanta fartura, e que tanto jeito dava cá)
- cadernos de desenho (máximo que conseguirem meter: no mínimo 3.000 caderninhos)
- material escolar (cadernos, canetas, lápis, lápis de cor, papel, giz, tudo o que se lembrarem faz falta cá, …)
- bolas de futebol (falar com as marcas para ver se dão alguma coisa de jeito, para distribuírem pelas escolas onde passam)
- coisas para oferecer às crianças, um simples décimo (1/10) de um snickers dá-lhes uma alegria nunca antes vista, se bem que toda a gente passa a vida a sorrir nesta terra…
- medicamentos
1) Praziquantel e Mebendazol máximo que conseguirem: no mínimo 3.000 de cada; aqui nada se estraga e é bem preciso porque há muitas crianças. Além daquelas crianças que vão à escola (que no conjunto de todas as tabancas com escola do sector, já são MUITAS), há muitas outras que não vão à escola, e às quais é difícil ter acesso, a não ser que se percorresse todas as casas, porta a porta.
2) Kits cirúrgicos básicos (tesoura, pinças, bisturi, porta agulhas, fios de sutura, …)
3) Kits de desinfecção: álcool, betadine, algodão, adesivo, compressas, pensos, ligaduras, … PODEM TRAZER O QUE CONSEGUIREM, PORQUE NÃO HÁ ABSOLUTAMENTE NADA.
4) Sulfato de ferro
5) Luvas (arranjem maneira de pedir pacotes aos fornecedores, desmarquem das enfermarias, … mas tragam para distribuir)
6) Kits de saúde com os fármacos combinados por nós.
7) AAS
8) Paracetamol
9) Cloroquina
10) Pomada AB’s e oftálmica


C: falar com o Gonçalo para meter aqui através da AD / IMVF uma série de equipamentos / objectos simples que são estritamente necessários nos vários locais:
1) camas
2) macas
3) berços
4) balanças
5) termómetros
6) cadeiras de rodas
7) IZASA: pedir mais cuvetes para doseamento de Hgb. Caso não usem todas, podemos deixar cá no Centro de Saúde de Iemberem porque fazem bastante falta. E caso dê tragam outro Hemoglobinómetro (LOL). Cravem esses caralhos, para deixarmos aqui no Centro de Saúde também.
8) fármacos IDA: aumentem o número de fármacos previamente estabelecidos e calculados por nós, se ainda for possível, para serem difundidos pelas várias tabancas.
9) meter cá um veículo de transporte, para funcionar como ambulância (LOL), no sentido de transportar as pessoas, que não têm como se deslocar, nem dinheiro, com complicações obstétricas e decorrentes da malária, para outros locais no Norte, onde existirão mais meios, oferecendo a possibilidade de salvamento aos mesmos.

D: Existe aqui em Iemberem o Centro de Saúde Materno Infantil como já devem saber.. No entanto está no terreno uma equipa de brasileiros (de uma ONG “lá da fazenda”), há já 4 anos, e da qual faz parte a Enf. Vera, que é responsável pelo centro e pela saúde local. Trabalham em parceria com o Governo e com a Administração Regional de Catió, tendo supervisão mensal por parte dos mesmos órgãos. Conta com uma série de fármacos da IDA (praticamente todos, tendo sido adquiridos por eles, sem ajudas governamentais), dois microscópios, lâminas e lancetas para avaliação serológica da malária – gota espessa. Contudo, têm falta de reagentes para tal avaliação, já que estes são de aquisição de extrema dificuldade (já tentaram trazer do Brasil, de Espanha de um colega médico, e através da CV, sem efeito). Por isso, se conseguirem trazer, tragam que não se perde.
Antes de iniciarem qualquer acção de formação aos ASB’s, devem informar a Enf. Vera, já que ela se quer inteirar da situação, tendo já em vista alguns jovens indivíduos mais capazes em se tornarem ASB’s nas várias tabancas da região.
Podem estabelecer contactos com Hospitais e outras entidades, no sentido de saber a possibilidade de doação de um ecógrafo para cá (para Centro de Saúde Materno-Infantil), já que este é um centro de referência em termos obstétricos, e contam apenas com um Sonar antigo (do qual não conseguem estabelecer com rigor as condições e apresentações dos partos), e sabendo também que há pessoal com formação em ecografia e disponibilidade para vir para cá trabalhar e ajudar este povo.

E: estamos a pensar já (após 2 dias de missão apenas), em fazer uma exposição fotográfica em Lisboa, com fotografias dos vários cenários que vão aqui encontrar, no sentido de fazer ver, rever, alertar, mostrar, “dar uma pequena ideia” do que é a vida aqui (não é que ainda não se saiba, mas é para continuar a passar a mensagem)!!! Portanto, se conseguirem preparem já alguns contactos / mails com pedido de patrocínios a gráficas, reprografias, empresas (DELTA CAFÉS SEMPRE ATÉ MORRER - família Nabeiro estaremos sempre convosco - sou do Campomaiorense desde pequenino!!!) … para podermos todos levar avante este projecto que o nosso amigo Dimy quer tanto ver realizado.

quinta-feira, novembro 22, 2007

Sicko


Foi já há quase duas semanas que vi este documentário. No habitual estilo popular/sensacionalista característico de Michael Moore, que durante tanto tempo fez as delícias de um grande número de intelectuais americanos que agora parecem desprezá-lo. Aborda a problemática da inexistência de um Serviço Nacional de Saúde, fazendo-nos encarar aquilo que para qualquer europeu parece, à partida, impensável.
Mesmo sabendo que é assim que as coisas se passam na maior economia (e potência) mundial, o encarar a realidade de alguns factos em concreto faz-nos reflectir no verdadeiro valor daquilo que (ainda) temos. Espero que seja uma força suplementar para um dia, caso seja necessário, todos lutemos por um direito inalianável...o direito à saúde.